sexta-feira, 18 de junho de 2010

POR QUE TE CHAMAS...SOLIDÃO?



 

Por que te chamas...Solidão?





É quando a noite chega que percebo,

que estás sempre a espera de que

eu me distraia e me espreitas,

para que eu saia e

então você se ensaia e me atormenta,

com essas asas imensas,

a me cobrir como o manto da escuridão intensa,

que me domina e me faz sentir,

o quanto a tua presença insiste em me perseguir.

Por mais que eu insista

e procure um lugar seguro,

ainda assim me encontras,

sozinha e no escuro e mesmo que eu diga,

não me persigas,

eu sei que estarás sempre a me seguir.

Às vezes me pergunto,

se não haverá outras formas de te seduzir,

sem que você perceba e te fazer sumir,

para que nunca mais você insista em me seguir,

mas você me diz, que mesmo que eu não te veja,

as tuas asas negras, como um manto,

serão sempre como as asas de um anjo,

E ainda assim te chamarás...Solidão...





Débora Benvenuti

SILÊNCIO


Silêncio
                

 

Ouço os sons do Silêncio,

ou será meu pensamento

que caminha lentamente,

perdido na neblina do tempo?

Ouço vozes.

Sons que me conduzem

por caminhos tortuosos,

por passagens e paisagens

esquecidas num canto

escuro do meu coração.

Onde vagueiam perdidos

os fantasmas da minha solidão.

Vejo vultos cambaleantes,

que se afastam lentamente,

envoltos na neblina do tempo.

Vagueiam em silêncio,

como sombras indecisas,

tal qual chama de uma vela

quando sopra a leve brisa.

Ouço o silêncio

do meu pensamento.

A noite é escura.

No céu, a lua ilumina a rua,

e eu esqueço

os meus tropeços.

Não sei se mereço

o que sinto

neste momento,

em que nada espero,

nada quero.

Só ouço o silêncio

do meu pensamento,

que voraz,

me devora,

enquanto o silêncio

que faz lá fora

vai embora...


 
Débora Benvenuti

terça-feira, 15 de junho de 2010

O DIVÓRCIO



O Divórcio





Anete e Carlos se conheceram na festa de aniversário de uma amiga em comum. Carlos foi o último convidado a chegar à festa. Anete estava sentada bem em frente à porta e logo que Carlos entrou, a percebeu. Não foram apresentados, mas Anete percebia os olhares dele para ela. Quando um amigo com quem Anete conversava se levantou, rapidamente Carlos sentou-se no sofá ao seu lado. Não demorou muito e eles estavam conversando como se conhecessem há anos e Carlos não perdia a oportunidade de trazer drinks e salgadinhos e oferecer à Anete. Depois da festa, os amigos decidiram que iriam num baile de chopp que acontecia num clube da cidade. Carlos convidou Anete para ir com ele e durante o baile, ele não se separou mais dela. Foi paixão à primeira vista. Nessa noite mesmo Carlos decidiu que a apresentaria a sua família no dia seguinte. Combinaram se encontrar no sábado à tarde, e ele a apresentaria aos seus pais e passariam o fim de tarde num balneário perto da cidade. Anete esperou até a hora marcada e como era muito pontual, não admitia esperar por ninguém, nem tampouco deixava alguém a esperar por ela. Quando o relógio bateu as duas badaladas, indicando a hora em que deveriam se encontrar, Anete não esperou mais. Retirou a sua motocicleta da garagem e saiu a andar sem destino. Voltou muitas horas depois. Sua mãe então lhe disse que Carlos estivera a sua procura e havia saído há poucos minutos. Anete não gostou do atraso, mas a curiosidade em saber o que havia acontecido não a deixou sossegar. Telefonou para a amiga de Carlos e contou o acontecido. Disse que estava furiosa com ele e que não costumava esperar por homem nenhum. Depois de dizer tudo o que pensava de Carlos a amiga confidenciou que Carlos estava ali com ela e ouvira toda a conversa. Ele então a convidou para saírem à noite e jantar. Prometeu ser pontual e assim aconteceu. Namoraram mais de três anos, sempre assim. Ele vinha todos os meses passar um final de semana com Anete e ela, sempre que dava, ia visitá-lo na cidade onde ele morava. Casaram-se algum tempo depois. No dia do casamento, Anete ficou em dúvida, se estava fazendo a coisa certa. Confidenciou a sua mãe, que se o casamento não desse certo, ela se divorciaria. Ficaram casados doze anos e tiveram um casal de filhos. Anete,logo que casou, percebeu que faltava alguma coisa no casamento, que ela não sabia o que era. Nos primeiros três anos, estavam decididos a terem um filho e isso ocupou demais os pensamentos de Anete. Quando a filha nasceu, Anete estava muito feliz e as suas preocupações, durante algum tempo, estavam restritas apenas à filha. Mesmo assim, Anete sentia que havia alguma coisa na relação com Carlos que a deixava triste. O marido era muito desleixado. Dizia que a amava, mas nunca fazia nada para demonstrar esse amor. Anete engravidou novamente algum tempo depois e acabou tendo um aborto. Ficou durante muito tempo com uma enorme sensação de vazio. Ficava horas na janela, imaginando o dia em que ela seria feliz. Ela tinha o seu trabalho, havia aberto uma micro-empresa com o marido e o ajudava sempre que podia, mas não era feliz. Durante muito tempo, foi alimentando a idéia da separação. Quando decidiu o que faria, esperou uma ocasião oportuna, em que os pais e a irmã estivessem presentes, para anunciar a separação. Conversou com a irmã, que era bioquímica e disse a ela que estava se sentindo diferente. Não sentia nenhum sintoma que justificasse que havia algo estranho nela, apenas havia ganho um pouco de peso. A irmã então, suspeitou que Anete estivesse grávida. Fizeram o teste e deu positivo. Mais uma vez, Anete sentiu que não era esse ainda o momento da separação. A mãe e a irmã a aconselharam a esperar mais um tempo, até o bebê nascer e então ela poderia resolver o que fazer. E foi o que Anete fez. Resignou-se a ficar junto ao marido mais um pouco, até os filhos ficarem maiores. Assim ela teria tempo suficiente para pensar e decidir com mais clareza. Mas Anete tinha certeza de que não era feliz. Sonhava em ser amada. Queria que o seu casamento desse certo. Carlos durante esse tempo, demonstrou ser uma pessoa inútil e vazia, sem nenhum interesse pelo futuro dos filhos. Não gostava de trabalhar. Dependia do pai, que todos os meses lhe enviava dinheiro para as suas despesas básicas. Até que chegou um dia em que Anete se cansou da vida vazia que levava ao lado de Carlos. Pediu o divórcio. Apesar dos filhos ainda pequenos, ela decidiu que iria morar bem longe do marido. O advogado que fez o divórcio era o irmão de Carlos e fez com que Carlos ficasse com todos os bens de Anete. Ela saiu de casa com o carro e levou o essencial para sobreviver bem longe dali. Voltou para a cidade onde morava com os pais. A casa da família estava desocupada. O pai de Anete já havia falecido e a mãe estava morando com a outra filha. No dia em que Anete saiu de casa, se preparava um temporal, mas como ela já havia enviado a mudança, com as poucas coisas que ela tinha, resolveu que precisava viajar assim mesmo. Apesar de não amar mais o marido, ficou sentida por ele não se preocupar nem com ela nem com a segurança dos filhos, pois a viagem era longa. Anete poucas vezes havia dirigido na estrada e muito menos com temporal. Mal ela havia viajado poucos quilômetros, o temporal desabou. A tarde virou noite e não se enxergava nada da estrada.Era a chuva caindo em torrentes lá fora e no seu coração, o temporal ainda era maior. Anete sabia que precisava ser forte. Tinha um casal de filhos viajando no banco traseiro e ela precisava de toda a sua coragem para atravessar aquele momento. Chegou uma hora em que se tornou difícil prosseguir. Anete então parou o carro no acostamento e esperou o temporal passar. As crianças estavam inquietas e Anete mais preocupada ainda estava em continuar a sua vida depois desse momento. Era uma vida completamente nova e ela estava sozinha. Depois de muito tempo ali parada, o temporal passou. Anete retomou a estrada e muitas horas depois ela chegou a sua casa. A sensação de abrir uma casa vazia e se instalar com os filhos pequenos era apavorante. Mesmo sem móveis, Anete montou um colchão de ar que havia levado, comprou um lanche para as crianças e adormeceram os três naquela primeira noite de vida nova. No outro dia, quando o caminhão chegou trazendo a mudança de Anete, foi que ela percebeu que os seus problemas estavam só começando. Era uma sensação estranha e os filhos teriam que se adaptar de qualquer maneira. Anete procurou escola para os filhos e conseguiu uma bem perto de sua casa e nessa mesma escola, ela conseguiu trabalhar, como professora, já que havia pedido transferência da escola anterior onde trabalhava. Recomeçar é uma palavra difícil e Anete sabia que os problemas estavam só começando.



Débora Benvenuti

segunda-feira, 14 de junho de 2010

DOA-SE UM CORAÇÃO




Doa-se um Coração


A quem quiser saber, eu vou dizer:

- Doa-se um coração!

Pisado, amassado, engessado,

mas mesmo assim, um coração!

Já foi enganado, maltratado

e quantas vezes bateu descompassado,

cada vez que sonhou ser amado?

Doa-se um coração,

velho, cansado, surrado,

mas mesmo assim um coração.

Carrega dentro de si sonhos, muitos sonhos,

mas nenhum deles realizado.

Por que será que esse coração

é assim tão enganado?

Se algum dia alguém quiser um coração,

saberá onde encontrar,

porque quando eu partir

comigo não vou levar

um coração que ninguém soube amar!

Talvez um outro alguém o faça bater

dentro de um outro peito.

com todos os defeitos

de um coração que só soube amar...



Débora Benvenuti

sábado, 12 de junho de 2010

NAMORADOS




 
Namorados





Estamos hoje afastados,

Será que ainda somos namorados?

Quando o tempo está do nosso lado

e a distância nos mantêm ocupados,

só temos o destino

que quer ser nosso cupido,

mas não encontra o termo certo,

nem acerta os ponteiros.

Não podemos fazer um cruzeiro,

muito menos sermos um inteiro.

Ainda temos o nosso segredo,

mas queremos que o mundo inteiro

seja nosso fiel escudeiro.

Amor é tudo o que temos

e desse amor nada escondemos.

Por que será que não podemos

nos encontrar como queremos?



Débora Benvenuti

sexta-feira, 11 de junho de 2010

UM AMOR SICILIANO



UM AMOR SICILIANO


 

Tudo começou quando Laura criou um perfil num site de relacionamentos. Não demorou mais que um dia e ela recebeu uma mensagem de um siciliano,que desejou muito conhecê-la. Ele parecia ser muito interessante. Como Laura era descendente de italianos, começaram logo a teclar pelo MSN. Ele tinha uma agência de turismos na Sicilia e ela morava no Brasil. Falavam-se todos os dias e se viam através da webcam. As horas que passavam teclando pareciam não ter fim. Faziam muitos planos. Queriam se encontrar e ficavam imaginando esse dia chegar de mil maneiras diferentes. Laura tinha um cyber café e Stefano queria que ela largasse tudo e trabalhasse com ele na agência de turismo. Pensaram até em abrir uma agência no Brasil. Fizeram muitos planos. Planejaram se encontrar em Portugal ou Espanha e de lá seguirem para o Egito, onde Stefano iria abrir uma nova agência. Laura ficava horas imaginando como seria esse dia. Fez aulas de italiano, porque queria poder entender tudo o que ele falasse e assim facilitar ainda mais a viagem, que não saia de sua cabeça. Tudo estava planejado, o passaporte pronto e a data da viagem definida. Mas faltando ainda um mês para a viagem, o cyber café de Laura foi arrombado durante a noite e todos os computadores roubados. Laura ainda estava pagando os computadores e o cyber estava funcionando há menos de três meses. Foi uma decepção enorme para Laura. A partir desse dia, as dificuldades aumentaram, mas Laura não desistiu do seu sonho. Comprou novamente novos computadores, porque não queria desistir e perder tudo o que havia investido ali. Tomou mais algumas precauções com a segurança do cyber, mas todo o esforço foi em vão. Não demorou muito tempo e Laura percebeu que não conseguiria mais se manter à frente dos negócios. Assumira muitas dívidas e não tinha como pagar. Stefano foi para o Egito, pois tinha que tratar dos seus negócios lá e sempre estava viajando e levando turistas de um lado para o outro do mundo. Nessa viagem ao Egito, ele se envolveu com uma italiana e Laura acabou descobrindo. Foi uma decepção muito grande para ela. Por uns tempos, o relacionamento dos dois esfriou um pouco. A vida de Laura também mudou. Ela se desfez de tudo o que tinha e mudou-se para outro estado, onde recomeçou a vida novamente. Mas o destino mais uma vez, fez com que Stefano e Laura se falassem e cada vez que isso acontecia, os dois refaziam os planos e sempre que estavam para realizar o sonho de se encontrarem, surgia um problema para atrapalhar e assim os anos foram se passando, mas os dois nunca desistiam de se encontrar. Por mais que o tempo passasse, bastava que se encontrassem no MSN e o desejo de se conhecerem pessoalmente voltava a se manifestar. Esse dia ainda não chegou para Laura, mas os dois continuam fazendo planos e decidiram que muito em breve esse sonho irá se realizar.

 


Débora Benvenuti

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O SONHO E A ESPERANÇA







A Esperança muitas vezes adormecia, pensando no Sonho, que todas as noites a visitava e a mantinha num torpor, quase irreal. E era sempre o mesmo Sonho que insistia em ser sonhado e deixava a Esperança cada dia mais animada. Quando acordava, alguma coisa dentro dela se entristecia. Acreditava no Sonho e desejava cada vez mais, que o Sonho continuasse da parte onde tinha acabado. Mas isso nem sempre acontecia. O Sonho sempre ia embora antes mesmo que a Esperança acordasse e pudesse reconhecer-lo em uma curva do caminho. A imagem que ela guardava do Sonho era a silhueta de um homem, que todas as noites chegava de mansinho, falava suave aos seus ouvidos e fazer juras de amor. Muitas vezes a Esperança estendia a mão para tocar o rosto do desconhecido, mas esse gesto acabava sempre numa névoa, que aos pouco se dissipava e a Esperança se tornava a cada dia, mais entristecida. Os dias se passavam, as noites se tornavam intermináveis ​​e o Sonho continuava a visitar a Esperança, sem no entanto, dar nenhuma esperança de ser reconhecida. Ela caminha tristemente pelas ruas, sempre na esperança de que em algum momento, o Sonho se concretizasse e ela pode por fim ao seu tormento. Era uma espera angustiante. Sabia que esse homem existia, só não sabia procura onde-lo. Por que ele não dava um sinal, alguma coisa com a qual ela pode identificá-lo, quando o encontrasse, mas nem isso ele faz. Pensou muitas vezes em sonhar acordada, para quando o Sonho aparecesse, ela pode-lo. Ficava noites e noites acordada, mas acabava se cansando e o sono se apropriado dos seus pensamentos. Uma noite, adormeceu e mais uma vez o homem dos seus sonhos apareceu. Ela então pode observar nitidamente um rosto do homem com o qual ela sonhara tantas noites: Era a Solidão, que a espreitava todas as noites ...



Débora Benvenuti

sábado, 5 de junho de 2010

A INTUIÇÃO


A Intuição



O dia amanhecia. Denise acordou quando o relógio despertou. Não sentiu nenhuma vontade de se levantar. Mas precisava trabalhar e aquela sensação estranha que as vezes ela sentia,mais uma vez a fazia relutar. Levantou-se,tomou o café da manhã apressada,pegou a bolsa e os livros e saiu para o trabalho. Lecionava em uma escola rural há poucos dias. Como sempre acontecia,passava na casa da amiga Núbia e iam as duas até a rodoviária,onde tomavam um ônibus,que as levava até a escola. Chegando na casa da amiga,Denise novamente sentiu aquela estranha sensação de que deveria ter ficado em casa. Comentou com a amiga e Núbia disse a ela que era uma grande bobagem. Ao chegarem na rodoviária,Denise novamente pensou em desistir e novamente a amiga a convenceu de que deveriam comprar logo as passagens e embarcar,para não se atrasarem. Ao entregarem as passagens ao cobrador,novamente aquela sensação de mal estar a impedia de raciocinar com clareza. As duas amigas se acomodaram no banco bem atrás do motorista,onde podiam ter uma visão melhor durante a viagem. Conversaram animadamente sobre a aula que deveriam dar naquela manhã e assim distraídas,mal perceberam quando o ônibus freou de repente. Foi Núbia quem primeiro percebeu o que estava acontecendo.Ela só teve tempo de dizer: vai bater. Em questão de segundos,as duas foram arremessadas contra o vidro que separava o banco em que estavam sentadas, do motorista.
A cerração era tão densa,que o motorista não percebeu uma retro-escavadeira que se movimentava na pista. O impacto foi tão grande,que as duas amigas bateram o rosto no vidro e quebraram o nariz. Denise vestia um macacão branco e um casaco de couro verde,que logo se tingiu de vermelho. Foram segundos que pareceram séculos. A fumaça que saía do radiador dava a impressão de que o ônibus estava pegando fogo. As portas de emergência não abriam e os passageiros gritavam alucinados,achando que não conseguiriam sair a tempo daquele inferno onde só se ouviam os gritos dos feridos. O motorista conseguiu sair por uma janela e como era um homem gordo e forte,começou a retirar os passageiros por ali. Denise ficou em estado de choque. Ouvia as pessoas gritarem e o som de suas vozes parecia que vinha de um outro mundo muito distante dali. Quando todos os passageiros foram resgatados, o motorista começou a atacar os carros que passavam para pedir que conduzissem os feridos até o hospital. Decidiram mandar primeiro as pessoas que estavam mais feridas. Denise foi a primeira a ser escolhida,tal o estado em que havia se transformado o seu rosto. Núbia a acompanhou. Estavam as duas feridas e não se sabia a gravidade das lesões. A viagem até a cidade parecia que não acabava nunca. Nenhuma das duas amigas sentia nada. Nenhuma dor. Só a estranha sensação de que estavam flutuando num espaço sem som algum. Ao chegarem ao hospital,ainda demoraram para serem atendidas. Denise não portava nenhum documento que a identificasse. Isso fez com que o seu atendimento demorasse mais ainda. Depois de serem atendidas,as duas amigas foram para casa,acompanhadas do pai da Núbia,que as foi buscar no hospital. Depois desse dia,Denise decidiu que toda a vez que tivesse aquela mesma sensação que a fazia hesitar,não pensaria duas vezes. Se achasse que não deveria ir a determinado lugar,ela desistia logo.E muitas outras vezes,ela teve essa mesma intuição.



Débora Benvenuti

sexta-feira, 4 de junho de 2010

O TOQUE




O Toque

  

Giovana estava casada há pouco tempo. Nunca havia saído de casa, a não ser agora, para morar no apartamento do marido,em uma cidade próxima da capital. Tinha o seu trabalho, que lhe tomava o tempo todo. Lecionava em uma grande escola de nível médio e apesar do pouco tempo na escola, já fizera algumas amizades. Mas em casa, ficava sempre sozinha...ou quase. Uma noite,enquanto lavava a louça na cozinha,seu pensamento a conduzia para muito distante dali. Perdia-se em pensamentos, como sempre fazia. Não conseguia se concentrar numa coisa só. Sempre fora assim. Estava num lugar, mas sempre imaginando estar em outro. Nessa noite, estava tão distraída que chegou a se assustar,quando sentiu um leve toque em seu ombro. Virou-se rapidamente, imaginando que fosse Carlos, o seu marido, querendo lhe fazer uma surpresa. Surpreendeu-se, quando não viu ninguém. Olhou novamente ao redor, mas não avistou ninguém. Mas aquela estranha sensação continuava a lhe impressionar. Sentira nitidamente aquela mão tocando o seu ombro, como se quisesse lhe chamar a atenção ou lhe falar alguma coisa. Outra vez, teve essa mesma sensação. Essas coisas aconteciam sempre que se encontrava sozinha, em silêncio e duas vezes ela estava na cozinha, de costas para a porta. Algumas vezes, sentia a presença de alguém ao seu lado. Virava-se rapidamente, e só via um vulto passando rápido,para lugar nenhum. Essas estranhas sensações vinham acontecendo já há vários anos. Quando ainda era adolescente, perdera o irmão mais velho, de maneira que muita dor lhe causara. E a dor não era fictícia, era real, mesmo. Lembrava-se nitidamente desse dia. Estava na varanda da casa, conversando com o irmão, quando ele sofreu o primeiro infarto. Tinha só dezoito anos, mas sofria de uma doença cardíaca desde que nascera. Seus pais e irmãos sabiam, alertados pelo médico, de que ele não viveria muito tempo. E assim aconteceu. Giovana ficou impressionada e sem saber o que fazer, gritou para a mãe e correram atrás de socorro e o conduziram ao hospital. No outro dia, pela manhã, Giovana estava em frente ao espelho, no quarto da mãe, reunindo algumas coisas para enviar para o hospital, quando sentiu um frio que lhe penetrou até os ossos. Olhou o relógio do irmão e percebeu que ele estava marcando onze horas. Poucos minutos depois, tocaram a campainha e a notícia de que o irmão havia falecido a deixou sem saber o que pensar. Nunca havia perdido ninguém e não sabia definir aquela sensação que estava sentindo. Era muito apegada ao irmão e isso a impressionou muito. Pouco tempo depois desse dia, Giovana começou a sentir um estranho aperto no peito, igual aquela dor que o irmão sentira, quando teve o ataque cardíaco. Já não sabendo mais o que fazer, um dia não suportou mais a dor e desmaiou da mesma forma como havia acontecido com o irmão. Ficou mais impressionada ainda, pois nunca havia desmaiado. Só voltou a si, quando a mãe a puxara pelos braços e o seu tornozelo se ferira ao ser arrastada até a cama. A mãe a levara ao médico e ficou constatado que tudo era psicológico. Com o tempo, ela esqueceria e tudo voltaria à sua rotina habitual. Só que os anos se passaram e aquela estranha sensação que oprimia o seu peito acontecia novamente, sempre no mês de abril, mês em que o irmão havia falecido. Lembrava-se disso agora, ali,naquele momento. Procurou pela irmã, que já tinha conhecimento dessas estranhas sensações de Giovana e ela a convidou a ir até a sua cidade, onde procuraram por uma pessoa que conseguia psicografar mensagens espirituais. Na carta que Giovana recebeu do irmão,datada daquele mesmo dia em que ele partira,estava a sua mensagem de adeus. Uma mensagem linda, em que o irmão dizia a ela que a amava e desejava que ela fosse muito feliz. Dizia ainda, que seria o seu anjo amigo. Quando quisesse falar com ele, não o procurasse na terra, porque na terra ela só encontraria os vestígios de que um dia ele estivera ali. Mas que mantivesse a calma e procurasse ouvir o silêncio, que ele lá estaria a lhe escutar. E assim aconteceu. A dor que Giovana sentia, nunca mais a incomodou. E quando ouvia o silêncio, podia perceber que não estava sozinha.


Débora Benvenuti

quarta-feira, 2 de junho de 2010

A ÚLTIMA VEZ



A última vez





Era uma noite fria e a neblina tornava a noite mais escura e densa. Suzana chegou em casa e tirou a capa prateada que sempre usava em dias chuvosos. Colocou a capa no cabide atrás da porta de entrada e dirigiu-se à sala de estar, esfregando as mãos úmidas e frias. Abaixou-se para pegar a lenha na caixa próxima à lareira e acendeu o fogo,com os gravetos mais finos que encontrou.
Assoprou um pouco,até se certificar de que a brasa iria se alastrar e assim aquecer um pouco mais o ambiente gelado. Dirigiu-se ao bar,serviu um cálice de licor e sentou-se na poltrona próxima à lareira. As chamas crepitavam agora e ela sentiu o calor do fogo começando a aquecer o ambiente. Ficou pensativa,a observar as sombras que a luz do fogo projetava na parede. Por um momento, deixou-se seduzir por aquela sensação de bem estar. Lembrou-se de uma outra noite igual aquela. Era inverno e ela não estava só. Felipe havia estado com ela naquela noite e os dois ficaram por um tempo interminável observando o fogo.
Beberam champagne,dançaram descalços em cima do tapete macio e depois deitaram-se em frente à lareira. Foi uma noite mágica, como nunca houvera outra igual. Fizeram amor várias vezes e Suzana sentiu que o amor que sentia por Felipe era tão intenso que fazia seu corpo todo estremecer, quando sentia as suas mãos tocarem o seu corpo nu. Felipe era um homem sedutor. Seu corpo másculo a fazia sentir-se ainda mais protegida, quando deitava a cabeça no seu peito e se aconchegava nos seu braços. Quando o dia amanheceu, Felipe se despediu com um beijo e disse a Suzana que voltaria na noite seguinte. Ele mesmo iria preparar um prato gostoso para os dois saborearem, regado a um bom vinho e depois teriam mais uma noite maravilhosa para passarem juntos. Foi a última vez que Suzana viu Felipe. Quando tocaram a campainha da porta e ela abriu, sentiu uma estranha sensação a dominar. Soube que Felipe havia sofrido um acidente e nunca mais voltaria para ela. E tinha sido numa noite igual aquela... fria e chuvosa. Suzana ficou mais alguns instantes fitando o vazio, sentindo aquela sensação estranha que invadia a sua alma e lhe trazia novamente as imagens daquela noite que ela nunca mais iria esquecer. Adormeceu e não percebeu uma fagulha da lareira cair no tapete.O fogo a se alastrar pela casa toda. Acordou num quarto de paredes brancas.Uma enfermeira ao seu lado, dizia-lhe que estava tudo bem. Não conseguia entender o que havia acontecido. Sua mente entorpecida pela fumaça inalada a impediam de raciocinar. Não sabia o que havia acontecido, nem ficaria sabendo jamais. Parte de sua memória se apagou e ela esqueceu quem era e as lembranças daquela noite nunca mais voltaram. Suzana deixou de ser quem era, para tornar-se alguém que ela desconhecia.

 


Débora Benvenuti